segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Médicos acima dos 70 anos dobram em dois anos no Brasil

Eles ingressaram na medicina muito antes do surgimento de tecnologias como a tomografia e a ressonância magnética. E continuam na ativa assistindo a cirurgias robóticas e a drogas biológicas de última geração.

Em dois anos, mais do que dobrou a participação de médicos acima de 70 anos no mercado de trabalho brasileiro. Eram 10,8 mil em 2011, segundo dados da publicação "Demografia Médica". Em 2013, somavam quase 25 mil. Não há dados específicos da capital paulista.

Segundo especialistas, a maior presença de médicos idosos no mercado é reflexo da maior expectativa de vida da população (estimada em 75 anos). Mas, para eles, no caso dos médicos, é necessária uma discussão sobre os limites da atuação e a hora de parar.

Médicos septuagenários

"Muitos seguem trabalhando até quando não conseguem mais sair de casa", diz Bráulio Luna Filho, presidente do Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo).

Segundo ele, nem todos os médicos conseguem enxergar as limitações impostas pela idade. Tanto que, eventualmente, aparecem casos no Cremesp em que o médico idoso é denunciado por colegas ou pacientes por cometer imperícias no exercício da profissão. "São raros, mas, quando aparecem, normalmente são cirurgiões que não têm mais a mesma habilidade de antes", explica.

Nesses casos, o conselho chama o médico e o aconselha a parar. Tem um limite de idade para isso? "Não. Vai depender das condições físicas e cognitivas", afirma Luna Filho.


Segundo ele, o paciente percebe quando o seu médico está fragilizado pela idade e naturalmente se afasta dele. "Tenho colegas que foram ótimos professores, que tinham um movimento grande e que, com a idade avançando, o consultório vai definhando, até o momento que o profissional percebe que não vale mais a pena continuar."
#ARSAO1810 ARTE PAGINA 24

O endocrinologista Ademar Ferreira de Carvalho Filho, 90, trabalhou regularmente até os 85 anos.
Formado na Escola Paulista de Medicina (Unifesp), ele atuou no início da carreira como cirurgião. Depois, especializou-se em endocrinologia. "Eram 12 horas de trabalho por dia, sala de espera sempre cheia", lembra Carvalho, que decidiu se aposentar quando perdeu parcialmente a visão.[...]

[..] Por outro lado, o conhecimento acumulado ao longo da vida é um fator muito positivo, na opinião de Kalache. "Não pode haver preconceito em relação à idade."

 [...] MULHERES

No universo de médicos septuagenários ou mais, as mulheres são a minoria, representam 14% do total. Em parte, isso é reflexo de uma época em que o público feminino era raro nas escolas de medicina, ao contrário do que ocorre hoje, em que a área vive um processo de feminização.

Na cirurgia, a médica Angelita Habr-Gama (prefere não revelar a idade) foi pioneira em várias cadeiras. Formada em 1957 pela USP, foi a primeira mulher titular em cirurgia da universidade, primeira a ser aceita pela sociedade americana de cirurgia e a primeira premiada pela sociedade europeia de cirurgia.

A médica faz questão de frisar que não se considera uma idosa e que não aparenta a idade que tem. "Tenho uma ótima saúde, enxergo e escuto bem, tenho uma coluna boa, não tremo, me alimento bem. Levo a vida que sempre vivi", afirma ela.[...]

Outra que teve que aderir à aposentadoria compulsória aos 70 (ou "expulsória", como ela prefere chamar), é a médica Silvia Regina Brandalise, 72, que também não pensa em parar. "Tenho planos profissionais por pelo menos mais 20 anos."

Há três décadas à frente do Centro Infantil Boldrini, de Campinas (SP), Silvia está envolvida em cursos de capacitação de profissionais, na clínica de crianças com câncer e em diversos projetos de pesquisa, entre eles um sobre os fatores ambientais relacionados ao câncer, como o uso de pesticidas e hormônios.

"Não tenho perfil de ficar andando com o cachorrinho na lagoa", brinca a médica, que tem eventos científicos agendados até meados de novembro, incluindo conferências em São Paulo, no Rio de Janeiro e em universidade de Oxford.[...]

 [...] Para ela, envelhecer é sinônimo de adaptação. "Quando as pernas não andarem mais, tem a bengala. Quando a bengala não funcionar, tem a cadeira de rodas. O importante é ir em frente."

Grifo nosso
Fonte: folhaonline.com.br/Cláudia Colucci
Imagem: folhapress

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