O direito à saúde é
superior a qualquer ato normativo que regule ou impeça a distribuição de
medicamentos.
Assim, a falta de
medicamento no âmbito do serviço de atenção básica à saúde não desobriga o ente
público de fornecê-lo a quem necessita.
Com este entendimento,
a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul manteve sentença que condenou o estado a fornecer medicamento à base do princípio ativo
Fingolimode a uma mulher diagnosticada com esclerose múltipla.
Com a decisão, foi
mantida a liminar que lhe garante receber o medicamento a cada seis meses,
mediante a apresentação do receituário médico atualizado.
Na contestação do pedido,
o estado ponderou a respeito dos protocolos clínicos, das diretrizes
terapêuticas do Ministério da Saúde e das obrigações prevista no artigo 196 da
Constituição Federal, que garante o direito à saúde.
Afirmou que não há comprovação de que o medicamento pleiteado seja
seguro e eficaz no tratamento da doença.
Por consequência, se
não estiver relacionado na lista do Sistema Único de Saúde (SUS), não tem como
ser fornecido à paciente. Logo, pediu que o pedido da peça inicial seja julgado
improcedente.
Sentença procedente
O juiz Felipe Peng
Giora, titular da vara judicial de Barra do Ribeiro (região metropolitana de
Porto Alegre), pontuou que o direito à saúde se constitui em direito
fundamental. Por isso, diferentemente do que alega o Estado, é equivocado
considerar as normas referentes à saúde como de cunho ‘‘meramente
programático’’. Antes, tais normas têm aplicação imediata, não necessitando de
norma integradora, conforme o artigo 5º, parágrafo 1º, da Constituição.
Segundo o julgador, a
documentação anexada ao processo mostra que a parte autora necessita de um
comprimido do remédio por dia, enquanto for necessário.
Se não utilizá-lo de
forma contínua, pode ser acometida de surtos, com a progressão de danos
neurológicos — que incluem cegueira, alterações cognitivas e perda de força.
Assim, no efeito prático, a ausência deste remédio pode levá-la a um quadro de
paraplegias ou tetraplegias (incapacitação das funções sensoriais e motoras nas
extremidades inferiores e superiores, respectivamente).
‘‘Não fosse isso,
conforme atestado médico, não há possibilidade de substituição da medicação
pleiteada, uma vez que o fármaco Fingolimode demonstrou ser superior aos
imunomoduladores (Betaferon, Avonex, Copaxone, Rebif) em termos de redução de
surtos, de lesões na ressonância e da progressão da doença’’, justificou na
sentença.
Além disso, esclareceu
que o medicamento Tysabri, embora constante nas listas do SUS, é pouco
indicado, levando-se em conta o risco elevado de infecção oportunista letal no
cérebro (Leucoencefalopatia Multifuncional Progressiva), o que pode levar o
paciente a óbito.
Afirmou ainda que o
laudo do médico que acompanha a parte autora deve prevalecer em relação ao
parecer genérico emitido pelos técnicos do estado, que sequer tiveram contato
com a paciente ou com seus exames.
E citou precedente da
1ª Câmara Cível do TJ-RS. Registra ementa do acórdão 70064117633, relatado pelo
desembargador Sérgio Luiz Grassi Beck: ‘‘O médico que acompanha o paciente é
quem possui as melhores condições de avaliar o seu estado de saúde e a
necessidade de prescrever o tratamento adequado para aliviar os sintomas da
enfermidade diagnosticada, não podendo prevalecer o entendimento demonstrado em
parecer genérico emitido pelos técnicos da SES que sequer tiveram contato com o
doente’’.
Apelação negada
Em decisão monocrática
no colegiado, o desembargador-relator Antonio Vinícius Amaro da Silveira negou
o recurso de apelação do Estado. Ele também entendeu que as ‘‘assertivas
genéricas’’ para negar a concessão do medicamento não se sobrepõem ao atestado
do médico que trata a autora. E este foi firme quanto à impossibilidade de uso
de outros medicamentos (todos fornecidos pelo SUS), tendo em vista que a doença
é grave e já se encontra num estágio avançado.[...]
Grifo nosso
Fonte: Conjur/ Jomar Martins
Imagem: youtube.com
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