Por prometer 100% de eficiência
de uma vasectomia — o que não é cientificamente possível — clínica e médico vão
pagar R$ 40 mil por danos morais a um casal que teve filhos gêmeos após o
marido fazer o tratamento. Isso porque o fornecedor responde, independentemente
da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por
defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos, segundo o artigo 14 do
Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90).
Foi com base neste dispositivo que a 9ª Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Rio Grande do Sul confirmou
sentença que condenou a clínica e
o médico pelo insucesso de uma cirurgia.
O titular da 6ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, juiz Oyama
Assis Brasil de Moraes, observou que a hipótese posta nos autos da ação
indenizatória não diz respeito a erro médico, mas à falha na prestação do
serviço.
Afinal, o anúncio da clínica, em
seu site, era claro: ‘‘A vasectomia pode falhar? A vasectomia é o método
anticoncepcional mais seguro que existe.
Quando realizado em nossa clínica, damos 100% de garantia em todos os
aspectos!’’
Para Assis Brasil, a possibilidade de ‘‘recanalização espontânea’’ da
vasectomia ou rejunção dos ductos, como esclarecido na perícia, mostra que o
método não é 100% eficiente, embora a possibilidade seja rara na literatura
médica.
Neste sentido, a responsabilidade dos demandados se materializou pela
propaganda enganosa, já que o termo de autorização e consentimento nada diz
sobre a possibilidade de recanalização. E ambos — clínica e médico — tinham a
obrigação de advertir o paciente sobre a falibilidade, ainda que pequena,
existente no procedimento.
O relator das apelações na corte, desembargador Carlos Eduardo
Richinitti, por outro lado, deduziu que os autores mantiveram relações, sem a
proteção de métodos contraceptivos, em data muito próxima à da liberação do
resultado do exame de espermograma. E a boa técnica recomenda o uso de
contraceptivos até que tenham ocorrido aproximadamente 25 ejaculações após a
cirurgia de vasectomia.
Conforme Richinitti, esta circunstância apontada pela defesa é
relevante, pois o casal não poderia ter mantido relações sem a certeza absoluta
do sucesso da intervenção médica.
Contudo, como se trata de
relação consumerista, a dúvida sobre a data real da relação deve favorecer o
consumidor.
Logo, foi forçado a concluir que a retomada das relações teria ocorrido
só após a obtenção do resultado do exame, liberado pela própria clínica. ‘‘Isso
é o normal, o contrário foge do aceitável, na medida em que o autor se submeteu
e pagou por uma intervenção médica, justamente para não ter mais filhos’’,
complementou.
Tal como o juízo de origem, o relator indeferiu o pedido de indenização
por danos materiais, consistente no pagamento de dois salários-mínimos para
cada filho, até completarem 21 anos.
A seu ver, a falha se deu apenas em relação ao direito de informação e
não em relação ao serviço propriamente dito, pois a provável "recanalização
espontânea" é evento da natureza que não pode ser evitado pelo
profissional médico.
Grifo nosso
Fonte: Conjur/ Jomar Martins
Imagem:materprime.com.br
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