Testamento vital é uma nomenclatura emprestada do “living will” da
língua inglesa, que se refere mais a um “desejo em vida” do que a um testamento
em si.
O “will” foi traduzido como testamento gerando uma leve confusão.
Ele é uma ferramenta para
manifestar vontades sobre tratos médicos no final da vida, no caso de estarmos
inaptos a tomarmos decisões ou a nos comunicarmos perante uma doença fora de
perspectivas de cura.
Portanto, não tem a ver com sucessão patrimonial como os testamentos.
Mas o nome pegou.
Além do registro de procedimentos médicos, é possível inserir
informações relativas a enterro, velório, destino para as cinzas, etc – que
também podem ser registradas em um outro documento, chamado codicilo.
A menção da vontade pela doação de órgãos ainda é polêmica, já que, no
Brasil, a lei de doação reconhece ser uma decisão da família e não do paciente.
O testamento vital faz parte das Diretivas
Antecipadas de Vontade, assim como o mandato duradouro – a nomeação pelo
paciente de um procurador para tomar decisões em seu nome, e pode ser feito por
qualquer pessoa acima de 18 anos que não tenha sido interditada, apesar de só
ter efeitos na eventualidade de uma doença terminal.
O documento pode expressar a opção por não ser reanimado, não ser
submetido a certas cirurgias ou a tratamentos para prolongamento da vida de
modo artificial, evitando certos procedimentos. Também pode servir justamente
para garanti-los. A questão central é seguir a vontade expressada pelo paciente
enquanto ele ainda estava em plena capacidade de juízo crítico e de
comunicação.
Segundo o Colégio Notarial do Brasil, o número de testamentos vitais
lavrados no país cresceu em 771% após a Resolução 1995/2012 do Conselho Federal de
Medicina (CFM) – que constata a obrigação dos médicos em aceitar o documento
como legítimo e levar em consideração a vontade do paciente incapacitado de
comunicar-se. É necessário respeitar as disposições do Código de Ética Médica,
por isso o documento não pode prever eutanásia (considerada crime no Brasil).
Um ano antes da regulamentação, os cartórios de notas brasileiros
haviam lavrado apenas 79 documentos. Em 2015, foram 668. Destaque para São
Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, os estados que mais realizaram esse
tipo de documento.
“Qualquer pessoa plenamente capaz pode fazer seu testamento vital
perante um tabelião de notas. Basta apresentar seus documentos pessoais e
declarar que tipo de cláusulas deseja incluir. A escritura será apresentada
posteriormente aos médicos pelos familiares ou por quem o declarante indicar
caso futuramente ele seja acometido por uma doença grave ou fique
impossibilitado de manifestar sua vontade em decorrência de algum acidente”,
explica o presidente do Colégio Notarial do Brasil – Seção São Paulo, Andrey
Guimarães Duarte.
O preço desse documento em São Paulo é de R$ 361,59 e pode variar de
estado para estado.
O Colégio Notarial lista 10
motivos para se fazer um testamento vital e registrá-lo em cartório:
1)Dignidade
Permite que o paciente escolha previamente a que tipo de tratamento
médico deseja ou não ser submetido, preservando o direito à vida e morte
dignas;
2)Tranquilidade
Não antecipa a morte do paciente (eutanásia), apenas garante que ela
ocorra de modo natural ou permite o seu retardamento, conforme a vontade do
paciente;
3)Respeito
Feita por escritura pública gera tranquilidade ao paciente de que a sua
vontade será respeitada quando ele não puder mais se manifestar;
4)Paz
Proporciona maior conforto e menos sofrimento para a família do
paciente no momento de dor;
5)Segurança
A escritura pública oferece maior segurança para o médico cumprir
integralmente os desejos do paciente, resguardando-o contra eventuais pressões
de seus familiares;
6)Autonomia
Pode ser feita por qualquer pessoa, a qualquer tempo, desde que ela
esteja lúcida e consiga expressar a sua vontade quanto ao destino de seu
próprio corpo;
7)Lealdade
É possível nomear um procurador para ficar responsável por apresentar
aos médicos e à família do paciente, os desejos e escolhas antecipadamente
feitas por ele;
8)Revogabilidade
Pode ser alterada ou revogada a qualquer tempo, desde que o paciente
esteja lúcido;
9)Perpetuidade
Fica eternamente arquivada em cartório, possibilitando a obtenção de
segunda via (certidão) do ato a qualquer tempo;
10)Liberdade
É livre a escolha do tabelião de notas qualquer que seja o domicílio da
parte.
Eu preciso ressaltar que a escritura pública não garante o cumprimento
do documento, apesar de com certeza aumentar as chances dele ser seguido.
Luciana Dadalto, uma porta-voz do tema, já me disse que a resolução do
Conselho de Medicina é insufiente, por apenas se referir às responsabilidades
dos médicos e não levar em consideração outros profissionais de saúde como os
enfermeiros. Também não garantiria uma validade legal ao documento. “Sempre vai
cair no arbítrio do poder judiciário, por não haver uma legislação específica.
Um juiz poderá falar que é válido e outro que não é”, ela diz.
É primordial a escolha de um médico que, desde já, se coloque como
alguém que alimenta um canal de comunicação sobre a morte, seu posicionamento
acerca da morte natural, da sedacão terminal, da internação na
UTI, sem tabus, e seja reconhecido por respeitar as vontades expressas em um
testamento vital.
Grifo nosso
Fonte: Jornal Folha de São Paulo/ Camila Appel
Imagem: Reprodução
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