sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Artigo: O médico e a transfusão de sangue em crentes Testemunhos de Jeová

Uma das situações mais conflitantes na atividade do exercício da medicina ocorre quando o profissional médico ao cuidar de um paciente grave em que sua crença religiosa é a Testemunha de Jeová se depara com a necessidade de se fazer transfusão de sangue.

Citando um caso concreto ocorrido em 1993 em São Vicente, litoral paulista, os pais proibiram que sua filha, uma garota de 13 anos, fosse submetida à transfusão e face à “obediência” da solicitação, a menina veio a óbito.
À época, foi aberto um processo contra os pais com a acusação de homicídio na qual o Ministério Público assentia e em 2010, o Tribunal de Justiça de São Paulo havia decidido que os pais deveriam ir a júri popular por homicídio doloso – quando há intenção de matar.

Nesta segunda-feira (11/08/2014) foi proferido os votos. “Os médicos deveriam ter feito a transfusão independentemente da vontade dos pais, como determina a ética médica”, segundo os votos dos ministros do STJ Sebastião Reis e Maria Thereza.

O processo havia chegado em sede de recurso ao STJ e a maioria dos ministros entenderam que não houve homicídio.

Nesse particular, no exercício da medicina estão envoltos 04 fatores preponderantes qual sejam: o respeito à crença religiosa abarcada pela Constituição/88, a ética médica, esta submetida ao Código de Ética Médica, o foro íntimo do profissional médico que por vezes não concorda com a solicitação e a mais dotada de imprevisibilidade que é decisão dos tribunais aos quais as causas são submetidas.

A questão se torna tão emblemática que certa feita, um profissional médico descumpriu a solicitação do paciente, o transfundiu e por ocasião da visita diária ao paciente em que naquela oportunidade receberia alta médica hospitalar, eis que afirmou ao médico: “mesmo estando vivo, me considero como se estivesse morto pois, o senhor matou minha alma”.

Nesse caso, o profissional médico estando inapto a enfrentar a real situação, corre o risco de assumir a insignificância insubstancial da inanidade de sua inexistência.

Mas afinal, como proceder o médico ao se deparar com essa situação?  


O melhor nesses casos é:

1) Paciente sem iminente risco de morte:

-reconhecer o direito a liberdade de crença;

- atualizar-se com relação a alternativas terapêuticas à transfusão sanguínea e hemocomponentes e utilizá-las quando indicadas;

- esclarecer ao paciente ou responsável legal, o diagnóstico, riscos, indicações terapêuticas e alternativas disponíveis;

- esclarecer ao paciente  que respeitará sua convicção religiosa e utilizará de todos os meios para evitar a transfusão, porém em situação de morte iminente e se a transfusão foi essencial para a manutenção da vida, o paciente será transfundido.

- se houver a permanência do conflito entre médico e paciente, o médico poderá renunciar ao atendimentodesde que comunique previamente ao paciente ou a seu representante legal, assegurando-se da continuidade dos cuidados e fornecendo todas as informações necessárias ao medico que lhe suceder (CEM -Art. 36, inciso 1°).

2) Em situação de risco de morte iminente e quando a transfusão de sangue e hemocomponentes for essencial para a manutenção da vida, o paciente devera ser transfundido, independente de sua vontade”. (CREMESC. Consulta nº 2044/2011).


Autor: João Bosco

Artigo publicado no jornal “O Hoje” de Goiânia / GO em 14-08-2014

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